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Uso de CPF na telefonia celular não resolve problemas e agora quem as digitais dos usuários de celular

Falar sobre privacidade no Brasil tem um ar de Teletubbies, sempre os temas voltam com os mesmos problemas.


Folha de S.Paulo noticia hoje que pessoas inocentes estão sendo investigados e, em alguns casos, até presos porque bandidos estão usando números no CPF de pessoas terceiras para poder cometer seus crimes. Lembrando que em 2008 (quase 11 anos atrás) eu noticiei a prisão de dois irmãos que usavam dados pessoais de terceiros para assinaturas de linhas de telefone e na mesma postagem trazia a informação que a Anatel dava sobre as "vantagens" do cadastramentos de usuários de telefones celulares prepagos:
33- Quais os benefícios que o cadastramento dos celulares pré-pagos trará para os usuários?
-O cadastramento trará os seguintes benefícios:-Com o cadastro, o governo terá conhecimento de quem usa o serviço, garantindo, assim, maior segurança pública;
Pelo jeito, os bandidos não acessaram a seção de perguntas frequentes da Anatel. E como é de praxe no Brasil, qual a solução para problemas criados pela coleta excessiva de dados? Mais coleta de dados! Como diz a reportagem:
Uma das medidas previstas é a modificação do serviço de checagem de dados do cliente, que exigirá mais informações do usuário para habilitação de linhas além do CPF.

“[O novo sistema] vai identificar se aquele CPF é válido, se é de alguém que ainda está vivo ou algum de falecido”, diz  Gustavo Santana Borges, o gerente de Controle de Obrigações de Qualidade da Anatel.
Ora, quem consegue um número no CPF consegue facilmente outras informações pessoais. E grande coisa se o sistema sabe se a pessoa está viva, o fato de alguém estar vivo não significa consentimento para o uso de suas informações pessoais. E o que tu fazer com tamanho aumento na coleta de dados pessoais? Centraliza tudo!
Outra medida prevista é a criação de um portal na internet onde ficarão concentradas as informações ao usuário, como quantas linhas estão cadastradas por nome.
Não basta apenas aumentar a coleta de dados pessoais. Não. Precisas colocar essas informações numa base centralizada, o que aumentará os incentivos para vazamentos e invasões. E sabes que informação que eles querem colocar nessa lista telefônica turbinada?
Até o final do próximo ano está previsto ainda o cadastramento de linhas por meio de um sistema que vai usar a identidade digital, a ser implantada pelo governo federal.

A ideia é que a habilitação use a digital do usuário, como ocorre atualmente em movimentações bancárias.
Eles literalmente querem a mão de quem usa os telefones. E se tu achas que a lei geral de "proteção" de dados pode te proteger disso, tenho más notícias:
Art. 11.  O tratamento de dados pessoais sensíveis somente poderá ocorrer nas seguintes hipóteses:
(...)
II - sem fornecimento de consentimento do titular, nas hipóteses em que for indispensável para:
a) cumprimento de obrigação legal ou regulatória pelo controlador;
Legalmente, a Anatel tem direito de pedir tuas impressões digitais para que tu possas utilizar telefone celular e o teu consentimento é irrelevante. Indo para o mundo real, esta é a realidade:
Um levantamento da Polícia Civil de São Paulo com base em dados de seis grandes operações realizadas desde 2016 (Ethos, Echelon, Protocolo Fantasma, Transponder, Sanctorum e Pacamã), quase todas envolvendo integrantes da facção PCC, aponta o tamanho da confusão.

O resultado revela que mais de 90% das cerca de 500 linhas telefônicas usadas pelos criminosos estavam em nome do chamado “terceiro inocente”: pessoa sem nenhuma ligação com o suspeito ou com o crime mas que teve dados usados em cadastro de celulares.

“Se a pessoa continuar colocando créditos no celular, pode falar por anos em nome de terceiros inocentes e praticar crimes. Temos casos de homicídios e vários outros tipos de crime imputados a pessoas inocentes”, diz o delegado Éverson Contelli, responsável pelo levantamento e que sugere mudança na lei.
Quem comete, ou cometerá, um crime está pouco se importando de usar dados de terceiros. E se hoje já se clona dados pessoais, clona-se também impressões digitais. E essa coleta e disseminação excessiva de dados cria vítimas reais:
Ainda amanhecia quando policiais armados invadiram a casa do funileiro Carlos Roberto Jusviaki, 26, em Curitiba.
(...)
Só na audiência de custódia, 15 dias após chegar à prisão, é que ele soube qual era seu crime: seu número de CPF havia sido usado no cadastro de um celular, em São Paulo, flagrado pela polícia no comércio de drogas pela internet.
(...)
Jusviaki foi preso duas vezes. A primeira, em 15 de março de 2018, a pedido da Polícia Civil de Brasília, com base nos crimes cometidos a partir de um celular de número de DDD 11 usado por uma mulher.
(...)
O delegado Ulysses Fernandes Luz, responsável pelo pedido de prisão, não quis falar com a Folha nem explicou, via assessoria, que elementos tinha contra Jusviaki além de um cadastro em seu nome.
A Polícia Federal de São Paulo não quis comentar o caso.
E casos como esses continuarão a ocorrer, com ou sem coletas de ainda mais dados de usuários de telefonia celular.

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