Depois daquela infame decisão do STF dizendo que a Receita Federal não precisa de autorização judicial para acessar dados bancários, não estou falando de dados cadastrais mas sim das movimentações, a garantia constitucional à privacidade e intimidade foi declarada inconstitucional. Tendo em vista isso, a Justiça Federal de São Paulo garantiu livre acesso aos dados cadastrais dos clientes da Claro sem precisar de ordem judicial, bastando unica e exclusivamente a vontade de delegados de polícia e de promotores.
Tudo começou quando o delegado de Polícia Federal de Sorocaba, SP requisitou a Claro a informação cadastral de dois chips numerados em 8950 53269 00157 80714 AACOO3 HLR69 e 89550 53168 00247 83503 AAC003 HLR68, com o aviso óbvio sobre a possível ocorrência de crime de desobediência. A Claro, por sua vez, respondeu:
A impetrante aduz que as provas pretendidas pela autoridade impetrada dependem de competente ordem judicial, em virtude de tais dados cadastrais estarem abarcados por garantias constitucionais, não podendo, por conseqüência, fornecer os dados cadastrais requisitados diretamente pela apontada autoridade impetrada, através de ofício de fls. 25, 29 e 34, sem prévia determinação judicial, pois, assim, estaria contrariando o princípio constitucional do sigilo de dados telefônicos e desobedecendo à legislação infraconstitucional disciplinadora dos serviços de telecomunicações (Lei n.º 9.472/97), bem como o artigo 5º, X, da Constituição Federal.
E o juízo federal de Sorocaba concordou com a argumentação da Claro:
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO INICIAL E CONCEDO A SEGURANÇA REQUERIDA, extinguindo o feito com resolução de mérito, com fulcro no disposto pelo artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, para o fim de assegurar à impetrante o direito de não fornecer os dados cadastrais das pessoas a quem pertencem os chips de nºs 8950 53269 00157 80714 AACOO3 HLR69 e 89550 53168 00247 83503 AAC003 HLR68, já que referido pleito está desamparado de autorização judicial, afastando-se a exigência contida nos ofícios da Delegacia de Polícia Federal sob nºs 877/2012, 1992/2012 e 2671/2012, em atenção ao disposto pelos artigos 5º, inciso X e XII e 93, inciso IX, todos da Constituição Federal.Houve o recurso e a coisa tomou outro rumo:
A questão posta no mandamus versa sobre a pretendida necessidade de autorização judicial para a disponibilização de dados cadastrais de usuários do serviço telefônico. Mais precisamente, se essas informações estão abrangidas no conceito de comunicações telefônicas, para fins da proteção prevista no art. 5º, XII, da CF/88.
O STF, quando do julgamento do HC 91.867/PA, decidiu que os conceitos de comunicação telefônica e registro de dados junto à empresa de telefonia não se confundem, reservando-se ao juízo a determinação de quebra do sigilo para investigação criminal ou instrução processual penal somente no primeiro caso.
(...)
Essa linha de pensamento é a correta, pois os chamados "dados cadastrais" dos usuários dos serviços telefônicos são as informações relativas ao proprietário de determinada linha telefônica, basicamente o nome completo, o próprio número da linha de telefone, o CPF, o RG e endereço; essas informações nada têm a ver com o conteúdo da comunicação telefônica, esse sim, inviolável a não ser sob ressalva judicial.
É de se lembrar que a Lei 12.850/13, ao disciplinar a repressão ao crime de organização criminosa e a instrução criminal respectiva, dispôs em seu art. 15 que o delegado de polícia e o Ministério Público terão acesso, independentemente de autorização judicial, aos dados cadastrais do investigado junto a empresas de telefonia, instituições financeiras, provedores de internet e administradoras de cartão de crédito, desde que informem exclusivamente a sua qualificação pessoal, filiação e endereço.
E logo apareceu a famosa lei das organizações criminosas, lembrando que fui criticado por defensores do Marco Civil sobre a questão dos dados cadastrais quando eu disse que haveria desvio de funcionalidade. Bom, eis o primeiro, de muitos exemplos.
O número do processo é 0000108-56.2013.4.03.6110.
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