O deputado federal Nelson Marchezan Jr. (PSDB-RS) apresentou na Câmara dos Deputados o PL 7759/2014, que "[a]ltera a Lei nº 9.454/1997, que institui o
número único de Registro de Identidade Civil e dá outras providências,
tornando obrigatória a identificação biométrica para a emissão de
documento de identidade". Pois é, a lei está a alguns passos de completar 20 anos e ainda não pegou, mas tem quem insista em emendar uma lei que já deveria ter sido despachada para algum planeta perto de Andrômeda. Este projeto condiciona a participação no Cadastro Único à coleta de dados biométricos do participante (dado biométrico este de livre escolha do Poder Executivo) e dá um prazo de seis anos para revogar todos os documentos de identidade que estiverem de acordo com tal procedimento. Pois bem, na justificativa do PL, temos as "vantagens" de criar um banco de dados biométricos sem precedentes no país:
Entre as inúmeras vantagens, está a maior eficiência e eficácia na proteção contra o tráfico de pessoas, articularmente mulheres e crianças, e a possibilidade da identificação inequívoca (sic) de pessoas em locais de grande aglomeração e nos transportes públicos intermunicipais, interestaduais e internacionais (grifo meu)
Deixando de lado a questão da "identificação inequívoca (sic)" de lado, que será abordada logo a seguir, o sr. Marchezan cita como uma "vantagem" do seu PL a identificação de pessoas em transportes públicos intermunicipais. Sim, haveria alguma vantagem em tu teres que te identificar para tu ires, sei lá, de Porto Alegre a Canoas de ônibus ou Trensurb. Já que eu não vejo vantagem alguma nisso, eu tuitei isto:
Não é isso."@NaoSouUmNumero: quer tuas impressões digitais até p saíres d tua cidade. O art 5º, inciso X ainda vale? http://t.co/ArPFrb3eiG"
— Nelson Marchezan Jr (@marchezan_) 19 outubro 2014
Eis que, inesperadamente, eu recebo uma resposta do sr. Marchezan: "Não é isso." Se "não é isso", então por que uma das "vantagens" do PL é "a possibilidade de identificação inequívoca (sic) de pessoas em locais de grande aglomeração e nos transportes públicos intermunicipais"? Aliás, qual é a razão para identificar-se inequivocamente alguém que utiliza transporte público intermunicipal? É para saber para aonde esta pessoa está indo? Esta "identificação inequívoca (sic)" é razoável? É proporcional? E a identificação em grandes aglomerações? O que é uma "grande aglomeração"? Mais de duas pessoas? Se tu não tens obrigação legal de portar documento de identidade contigo, por que tu haverias de portar um documento de identidade do Cadastro Único?
Aí tem uma matéria na Agência Câmara Notícias sobre o PL, com a seguinte frase:
ATENÇÃO! ESTE PROJETO DE LEI FOI APRESENTADO NO DIA 17 DE OUTUBRO DE 2014, PORTANTO, APÓS O PRIMEIRO TURNO DAS ELEIÇÕES GERAIS DE 2014, REALIZADO NO DIA 5 DE OUTUBRO DE 2014. Bom, eu venho coletando desde o dia 5 de outubro, exemplos do desastre que foi o uso de identificação biométrica nas eleições, ao ponto do presidente do TRE do Rio de Janeiro dizer que "as urnas biométricas foram uma solução para um problema inexistente". Lembrando que, somente em Niterói, 12,44% das pessoas não foram identificadas pelas urnas biométricas, após oito tentativas com oito dedos diferentes! Além de esperas de horas nas filas de votação (em Teresina as filas chegaram a três horas). "Um sistema seguro, confiável e de rápida operação"...
Este vídeo mostra a segurança da identificação biométrica...
Outra justificativa do PL seria esta:
"[O] cumprimento da lei [9454/1997]"... É isto mesmo que tu estás lendo. A identificação biométrica reforçaria o cumprimento duma lei que não pega há 17 anos, 7 meses e 13 dias até hoje. Lembrando que o art. 6º da dita lei, cujo cumprimento terá o reforço da biometria, previa que os documentos em desconformidade com a lei seriam considerados inválidos em cinco anos. Artigo este revogado pela Lei 12058/2009, porque, bem, é uma lei que pegou... E tem outra também, tem a questão da constitucionalidade da Lei 9454/1997, algo que foi lembrado aos colegas do sr. Marchezan:
E se nós ficarmos na discussão entre privacidade e autonomia dos estados, teremos muito pano para manga. E vamos falar de coisa práticas. O teste do RIC foi suspenso pois "o ministério da Justiça identificou falhas no sistema de segurança". E sabes quanto isto custou? Dou-te os números:
Sim este é o CUsto do Cadastro Único, quase dois milhões de reais por um cartãozinho.
Agora, seja pela "identificação inequívoca (sic) de pessoas em locais de grande aglomeração e nos transportes públicos intermunicipais" ou pelo projeto em si, eu não sentirei saudade deste projeto quando este provavelmente expirar graças ao decurso da atual legislatura.
Postado no Trezentos.
Aí tem uma matéria na Agência Câmara Notícias sobre o PL, com a seguinte frase:
O autor da proposta argumentou que a Justiça Eleitoral vem utilizando o sistema biométrico com sucessoExceto se o sr. Marchezan contestar esta afirmação, dou-a como expressada pelo sr. Marchezan. E para solidificar meu argumento, trago mais uma passagem da justificativa do PL:
A identificação biométrica já é adotada pela Justiça Eleitoral, assim como a autenticação biométrica pelo Supremo Tribunal Federal, que também vem sendo experimentada pelo sistema bancário brasileiro, comprovando-se um sistema seguro, confiável e de rápida operação.
Este vídeo mostra a segurança da identificação biométrica...
Outra justificativa do PL seria esta:
Observe-se que o projeto de lei em pauta, ao lado de determinar que a identificação de todos os cidadãos em nosso País passe a ser efetuada por método biométrico, reforça o cumprimento da lei que instituiu o número único de Registro de Identidade Civil.
Mas o representante do Ministério da Justiça, Marivaldo Pereira, argumentou que seria inconstitucional obrigar os estados a aderirem ao sistema unificado, o que levou inclusive à modificação da lei, que previa inicialmente um número que unificaria todos os documentos.
O desgoverno federal torrou R$ 90 milhões para produzir 14 mil cartões CU, ou seja, custa a bagatela de R$ 6.428,57 per capita para darem entrada no CU. Considerando os cartões CU válidos, chegamos a fabulosa quantia de R$ 1.730.769,23 per capita por cartão válido.
Agora, seja pela "identificação inequívoca (sic) de pessoas em locais de grande aglomeração e nos transportes públicos intermunicipais" ou pelo projeto em si, eu não sentirei saudade deste projeto quando este provavelmente expirar graças ao decurso da atual legislatura.
Postado no Trezentos.
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