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Mandado em branco

O juiz Gustavo Quintanilha Telles de Menezes, da 26ª Vara Cível do Rio de Janeiro, obrigou a Google do Brasil LTD a fornecer dados como IP, datas e horas para o Ministério Público e Polícia Civil do RJ sob pena de multa de R$ 50.000 por dia; tal decisão é uma antecipação de tutela do processo 2007.001.179527-2.

Faz-se necessária uma leitura da decisão do juiz Menezes, uma decisão para lá de bizarra:
A atitude do réu constitui uma afronta ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, instituição democrática e cujas prerrogativas têm sede constitucional...
A atitude de afronta do réu é o fato do mesmo só liberar tais dados mediante ordem judicial, algo, digamos assim, comum a qualquer comunidade organizada que respeita os direitos individuais de seus membros.
As informações inseridas nos cadastros do sítio eletrônico Orkut, não são ali inseridas com qualquer caráter sigiloso, ao contrário, lá estão para exposição pública, estando os usuários do serviço cientes deste fato, notadamente pelo conhecimento das regras explicadas pelo próprio site. Os dados técnicos de comunicações internas no site e a eventual numeração das máquinas e programas (IP's), passível de ser obtida pelo protocolo de troca de dados e que podem servir à localização e identificação de pessoas, não são fornecidas por ocasião do cadastro, sendo conhecidas pelo simples fato da utilização do site. Com efeito, não se cogita de informação protegida, mas sim informação que o réu detém acerca de seus usuários, pelo simples fato da utilização do serviço, a semelhança do endereço de consumidores de concessionárias de serviço público.
Antes de mais nada: "sítio eletrônico"! Que coisa mais xenofóbica; usa site e pronto! Aí, Menezes, na comum lógica binaróide de privacidade, se esquece do fato que os usuários do Orkut podem, a qualquer momento, transformar quaisquer informações em privadas, ou, então, restringir a visibilidade dos mesmo. Então ele cria um novo conceito de privassidade, onde informações criadas pela interação de partes não teria a mesma proteção de dados do que informações dadas para o começo desta interação. Exemplo: se tu tiveres uma relação estabelecida com um médico e levares para este um exame dizendo que tu tens AIDS, esta informação não estaria protegida. Entendeste a lógica tremebunda de Menezes? E para completar, Menezes se usa do avançado conceito de "dois erros fazem um acerto" com sua comparação sem fundamentação com concessionárias de serviços públicos, algo que o Orkut não é.
Note-se que sequer há qualquer segurança quanto a veracidade dos dados dos usuários, pelo que assentuadamente reduzida eventual proteção a dados potencialmente fictícios, livremente disponibilizados em site de acesso público
Esta seria uma espécie de ato falho. Primeiro ele assume que não "há qualquer seguraça quanto a veracidade" das informações, o que nos faz pensar por que tal ânsia em ter estas informações. Continuando com sua carreira no Crube de Hamigos da Privassidade, Menezes também desprotege informações pelo simples fato delas poderem ser fictícias, ou seja, basta presumir que haja informações fictícias num banco de dados para que este mesmo banco de dados esteja desprovido de qualquer tipo de proteção de dados.
Insta salientar que a alegação de que os dados estariam armazenados em provedores fora do país, consiste em insulto às autoridades requisitantes, visto que tanto é notório que as informações podem ser estantaneamente (sic) obtidas pelo réu, através da prórpia rede mundial de computadores - inexistindo impossibilidade física - quanto é patente que sendo as pessoas que responderam prepostas do réu, respondem pessoalmente pela flagrante desobediência.
Isto é algo fascinante! Se tu alegas que qualquer coisa esteja armazenada fora do país, isto constitui um "insulto às autoridades requisitantes". Cuidado, se um dia tu alegares para um policial civil no Rio de Janeiro que o Schloss Bellevue fica em Berlim, tu poderás ser preso por desacato, injúria und so weiter.
Diálogo menezianóide:
- Das Schloss Bellevue liegt am Spreeweg 1, in Berlin!
- Teje preso!
- Was bedeutet das?
Não apenas Menezes tem algo contra a privacidade mas tambem contra a língua portuguesa. Mas que diabos seria "estantaneamente"? Ah, se os computadores estão conectados numa mesma rede, tu podes acessar sem maiores dificuldades os dados instalados em outras máquinas? E se a matriz se recusar a informar tais dados? E se o Global Internet Freedom Act of 2007 virar lei nos EUA?
Posto isso, DEFIRO A ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA, exclusivamente, por ora, para ACOLHER a argumentação do Minstério Público do Estado do Rio de Janeiro, de que não há sigilo de dados nas informações relativas a dados cadastrais dos usuários do Orkut que praticarem crime, números de IP's, data e hora completa (referência horária, inclusive GMT, BRT).
Opa, acho que Menezes não freqüentou a cadeira de Direito Constitucional, haja visto que o mesmo não conhece o princípio da presunção de inocência nem tampouco a impossibilidade constitucional que o MP e a Polícia Civil tem em dar vereditos penais.

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